AGRAVO REGIMENTAL NO HABEAS CORPUS. TRÁFICO DE DROGAS. DESCLASSIFICAÇÃO. EXCEPCIONALIDADE. AUSÊNCIA DE PROVAS CONCLUSIVAS ACERCA DO NARCOTRÁFICO. AGRAVO REGIMENTAL NÃO PROVIDO.
1. É entendimento pacífico da jurisprudência – tanto deste Superior Tribunal quanto do Supremo Tribunal Federal – de que a pretensão de desclassificação de um delito em habeas corpus exige, em regra, o revolvimento do conjunto fático-probatório produzido nos autos, providência incabível, em princípio, na via mandamental, de cognição sumária.
2. No caso, o réu não foi flagrado ou observado em ação de comercialização da droga, expondo à venda, entregando ou fornecendo substâncias entorpecentes a consumo de terceiros. Também não foi apreendido com ele nenhum outro objeto indicativo de que as drogas (apenas 0,486 g de cocaína e de 0,215 g de crack) encontradas com ele pudessem ser destinadas ao tráfico.
3. O fato de que as drogas estavam fracionadas e embaladas na forma típica de venda não prova que o entorpecente se destinava ao comércio ilícito. Ora, por imperativo lógico, se a porção é vendida de forma fracionada e embalada, é porque também é comprada nesse estado, de modo que pode ser encontrada nessa condição tanto na posse de um usuário quanto na de um traficante. Pelo mesmo raciocínio, a circunstância de o local ser conhecido pela venda de drogas não autoriza presumir que todo indivíduo ali encontrado com entorpecentes seja traficante, uma vez que ponto de venda é também ponto de compra. Igualmente, a pequena quantia de dinheiro encontrada não basta para demonstrar a traficância, porque é plenamente possível e até plausível que usuários de drogas tenham dinheiro consigo.
4. Nada impede que um portador de 0,486 g de cocaína e de 0,215 g de crack, a depender das peculiaridades do caso concreto, seja um traficante, travestido de usuário, ocasião em que, “desmascarado” pelas provas efetivamente produzidas ao longo da instrução criminal, deverá ser assim condenado. No entanto, na espécie ora em análise, a apreensão de apenas essa quantidade de drogas e a ausência de diligências investigatórias que apontem, de maneira inequívoca, para a narcotraficância evidenciam ser totalmente descabida a condenação pelo delito previsto no art. 33, caput, da Lei n. 11.343/2006, o que conduz à desclassificação da conduta imputada ao recorrido para o delito de posse de drogas para consumo pessoal (art. 28 da Lei n. 11.343/2006).
5. Especificamente no caso dos autos, a conclusão pela desclassificação da conduta imputada ao réu não demanda o revolvimento aprofundado de matéria fático-probatória, procedimento vedado em habeas corpus. O caso em análise, diversamente, requer apenas a revaloração de fatos incontroversos que já estão delineados nos autos e das provas que já foram devidamente colhidas ao longo de toda a instrução probatória, bem como a discussão, meramente jurídica, acerca da interpretação a ser dada sobre os fundamentos apontados pelas instâncias ordinárias para condenar o réu pela prática do crime de tráfico de drogas.
6. Agravo regimental não provido..
1. PEDIDO DA DEFESA
A defesa de Jairo Borges Lopes impetrou habeas corpus com pedido de liminar visando à desclassificação da conduta do réu de tráfico de drogas (art. 33 da Lei n. 11.343/2006) para posse de drogas para consumo pessoal (art. 28 da mesma lei). A defesa argumentou que não havia provas conclusivas de que as drogas encontradas com o réu eram destinadas ao tráfico, solicitando assim a reavaliação da condenação.
2. TESES DA DEFESA
A defesa sustentou que a condenação por tráfico de drogas era inadequada, pois o réu não foi flagrado vendendo, entregando ou fornecendo drogas. Também não foram apreendidos objetos que indicassem o tráfico, como balanças de precisão ou grandes quantias de dinheiro. Argumentou que as pequenas quantidades de drogas encontradas (0,486 g de cocaína e 0,215 g de crack) e o fato de estarem fracionadas e embaladas não comprovam a intenção de tráfico, pois essas condições podem ser encontradas tanto com usuários quanto com traficantes. Alegou ainda que a localização do réu em um ponto conhecido por venda de drogas não é suficiente para presumir traficância.
3. FUNDAMENTOS DA DECISÃO
A decisão baseou-se na jurisprudência que estabelece que a desclassificação de um delito em habeas corpus exige, em regra, o revolvimento do conjunto fático-probatório, o que não é cabível na via mandamental. No entanto, no caso em análise, a ausência de flagrante de comercialização, a pequena quantidade de drogas apreendidas e a falta de outras evidências concretas de tráfico (como grandes quantias de dinheiro ou objetos associados ao tráfico) indicam que a condenação pelo delito de tráfico foi inadequada. A decisão enfatizou que a revaloração dos fatos incontroversos e das provas já colhidas permitia a desclassificação para posse de drogas para consumo pessoal, sem a necessidade de aprofundamento fático-probatório.
4. DISPOSITIVO DA DECISÃO
O agravo regimental foi não provido, mantendo-se a desclassificação da conduta imputada ao réu de tráfico de drogas (art. 33 da Lei n. 11.343/2006) para posse de drogas para consumo pessoal (art. 28 da mesma lei). A decisão concluiu que a quantidade de drogas apreendidas, as circunstâncias do flagrante e a ausência de provas conclusivas de narcotraficância não justificavam a condenação por tráfico, tornando adequada a desclassificação para o delito de posse de drogas para consumo pessoal.